domingo, 19 de dezembro de 2010

Inquietude permanente

Era o sol
e o calor
iguais

não me escondia
como tudo que entra
diferente saía

o poder da transformação
implacavelmente
determina:

a síntese do nada de ontem
que hoje sente a natureza incompleta do amanhã
a argila inacabada que somos.

No mesmo sol,
no mesmo calor,
o tempo passa.

sábado, 27 de novembro de 2010

Pensamento do dia.

Do dito popular:

Queria que aqui fosse o inferno - lugar de pessoas bem intencionadas.

O muro das letras.

O texto é longo, mas vale a pena lê-lo. Embora teórico e enfadonho, é digno de atenção e posterior postura reflexiva acerca do tema tão presente, redundante nos dias de hoje.

A crise no Rio e o pastiche midiático

QUINTA-FEIRA, 25 DE NOVEMBRO DE 2010


Sempre mantive com jornalistas uma relação de respeito e cooperação. Em alguns casos, o contato profissional evoluiu para amizade. Quando as divergências são muitas e profundas, procuro compreender e buscar bases de um consenso mínimo, para que o diálogo não se inviabilize. Faço-o por ética –supondo que ninguém seja dono da verdade, muito menos eu--, na esperança de que o mesmo procedimento seja adotado pelo interlocutor. Além disso, me esforço por atender aos que me procuram, porque sei que atuam sob pressão, exaustivamente, premidos pelo tempo e por pautas urgentes. A pressa se intensifica nas crises, por motivos óbvios. Costumo dizer que só nós, da segurança pública (em meu caso, quando ocupava posições na área da gestão pública da segurança), os médicos e o pessoal da Defesa Civil, trabalhamos tanto –ou sob tanta pressão-- quanto os jornalistas.

Digo isso para explicar por que, na crise atual, tenho recusado convites para falar e colaborar com a mídia:

(1) Recebi muitos telefonemas, recados e mensagens. As chamadas são contínuas, a tal ponto que não me restou alternativa a desligar o celular. Ao todo, nesses dias, foram mais de cem pedidos de entrevistas ou declarações. Nem que eu contasse com uma equipe de secretários, teria como responder a todos e muito menos como atendê-los. Por isso, aproveito a oportunidade para desculpar-me. Creiam, não se trata de descortesia ou desapreço pelos repórteres, produtores ou entrevistadores que me procuraram.

(2) Além disso, não tenho informações de bastidor que mereçam divulgação. Por outro lado, não faria sentido jogar pelo ralo a credibilidade que construí ao longo da vida. E isso poderia acontecer se eu aceitasse aparecer na TV, no rádio ou nos jornais, glosando os discursos oficiais que estão sendo difundidos, declamando platitudes, reproduzindo o senso comum pleno de preconceitos, ou divagando em torno de especulações. A situação é muito grave e não admite leviandades. Portanto, só faria sentido falar se fosse para contribuir de modo eficaz para o entendimento mais amplo e profundo da realidade que vivemos. Como fazê-lo em alguns parcos minutos, entrecortados por intervenções de locutores e debatedores? Como fazê-lo no contexto em que todo pensamento analítico é editado, truncado, espremido –em uma palavra, banido--, para que reinem, incontrastáveis, a exaltação passional das emergências, as imagens espetaculares, os dramas individuais e a retórica paradoxalmente triunfalista do discurso oficial?

(3) Por fim, não posso mais compactuar com o ciclo sempre repetido na mídia: atenção à segurança nas crises agudas e nenhum investimento reflexivo e informativo realmente denso e consistente, na entressafra, isto é, nos intervalos entre as crises. Na crise, as perguntas recorrentes são: (a) O que fazer, já, imediatamente, para sustar a explosão de violência? (b) O que a polícia deveria fazer para vencer, definitivamente, o tráfico de drogas? (c) Por que o governo não chama o Exército? (d) A imagem internacional do Rio foi maculada? (e) Conseguiremos realizar com êxito a Copa e as Olimpíadas?

Ao longo dos últimos 25 anos, pelo menos, me tornei “as aspas” que ajudaram a legitimar inúmeras reportagens. No tópico, “especialistas”, lá estava eu, tentando, com alguns colegas, furar o bloqueio à afirmação de uma perspectiva um pouquinho menos trivial e imediatista. Muitas dessas reportagens, por sua excelente qualidade, prescindiriam de minhas aspas –nesses casos, reduzi-me a recurso ocioso, mera formalidade das regras jornalísticas. Outras, nem com todas as aspas do mundo se sustentariam. Pois bem, acho que já fui ou proporcionei aspas o suficiente. Esse código jornalístico, com as exceções de praxe, não funciona, quando o tema tratado é complexo, pouco conhecido e, por sua natureza, rebelde ao modelo de explicação corrente. Modelo que não nasceu na mídia, mas que orienta as visões aí predominantes. Particularmente, não gostaria de continuar a ser cúmplice involuntário de sua contínua reprodução.

Eis por que as perguntas mencionadas são expressivas do pobre modelo explicativo corrente e por que devem ser consideradas obstáculos ao conhecimento e réplicas de hábitos mentais refratários às mudanças inadiáveis. Respondo sem a elegância que a presença de um entrevistador exigiria. Serei, por assim dizer, curto e grosso, aproveitando-me do expediente discursivo aqui adotado, em que sou eu mesmo o formulador das questões a desconstruir. Eis as respostas, na sequência das perguntas, que repito para facilitar a leitura:

(a) O que fazer, já, imediatamente, para sustar a violência e resolver o desafio da insegurança?
Nada que se possa fazer já, imediatamente, resolverá a insegurança. Quando se está na crise, usam-se os instrumentos disponíveis e os procedimentos conhecidos para conter os sintomas e salvar o paciente. Se desejamos, de fato, resolver algum problema grave, não é possível continuar a tratar o paciente apenas quando ele já está na UTI, tomado por uma enfermidade letal, apresentando um quadro agudo. Nessa hora, parte-se para medidas extremas, de desespero, mobilizando-se o canivete e o açougueiro, sem anestesia e assepsia. Nessa hora, o cardiologista abre o tórax do moribundo na maca, no corredor. Não há como construir um novo hospital, decente, eficiente, nem para formar especialistas, nem para prevenir epidemias, nem para adotar procedimentos que evitem o agravamento da patologia. Por isso, o primeiro passo para evitar que a situação se repita é trocar a pergunta. O foco capaz de ajudar a mudar a realidade é aquele apontado por outra pergunta: o que fazer para aperfeiçoar a segurança pública, no Rio e no Brasil, evitando a violência de todos os dias, assim como sua intensificação, expressa nas sucessivas crises?

Se o entrevistador imaginário interpelar o respondente, afirmando que a sociedade exige uma resposta imediata, precisa de uma ação emergencial e não aceita nenhuma abordagem que não produza efeitos práticos imediatos, a melhor resposta seria: caro amigo, sua atitude representa, exatamente, a postura que tem impedido avanços consistentes na segurança pública. Se a sociedade, a mídia e os governos continuarem se recusando a pensar e abordar o problema em profundidade e extensão, como um fenômeno multidimensional a requerer enfrentamento sistêmico, ou seja, se prosseguirmos nos recusando, enquanto Nação, a tratar do problema na perspectiva do médio e do longo prazos, nos condenaremos às crises, cada vez mais dramáticas, para as quais não há soluções mágicas.

A melhor resposta à emergência é começar a se movimentar na direção da reconstrução das condições geradoras da situação emergencial. Quanto ao imediato, não há espaço para nada senão o disponível, acessível, conhecido, que se aplica com maior ou menor destreza, reduzindo-se danos e prolongando-se a vida em risco.

A pergunta é obtusa e obscurantista, cúmplice da ignorância e da apatia.
(b) O que as polícias fluminenses deveriam fazer para vencer, definitivamente, o tráfico de drogas?

Em primeiro lugar, deveriam parar de traficar e de associar-se aos traficantes, nos “arregos” celebrados por suas bandas podres, à luz do dia, diante de todos. Deveriam parar de negociar armas com traficantes, o que as bandas podres fazem, sistematicamente. Deveriam também parar de reproduzir o pior do tráfico, dominando, sob a forma de máfias ou milícias, territórios e populações pela força das armas, visando rendimentos criminosos obtidos por meios cruéis.
Ou seja, a polaridade referida na pergunta (polícias versus tráfico) esconde o verdadeiro problema: não existe a polaridade. Construí-la –isto é, separar bandido e polícia; distinguir crime e polícia-- teria de ser a meta mais importante e urgente de qualquer política de segurança digna desse nome. Não há nenhuma modalidade importante de ação criminal no Rio de que segmentos policiais corruptos estejam ausentes. E só por isso que ainda existe tráfico armado, assim como as milícias.

Não digo isso para ofender os policiais ou as instituições. Não generalizo. Pelo contrário, sei que há dezenas de milhares de policiais honrados e honestos, que arriscam, estóica e heroicamente, suas vidas por salários indignos. Considero-os as primeiras vítimas da degradação institucional em curso, porque os envergonha, os humilha, os ameaça e acua o convívio inevitável com milhares de colegas corrompidos, envolvidos na criminalidade, sócios ou mesmo empreendedores do crime.

Não nos iludamos: o tráfico, no modelo que se firmou no Rio, é uma realidade em franco declínio e tende a se eclipsar, derrotado por sua irracionalidade econômica e sua incompatibilidade com as dinâmicas políticas e sociais predominantes, em nosso horizonte histórico. Incapaz, inclusive, de competir com as milícias, cuja competência está na disposição de não se prender, exclusivamente, a um único nicho de mercado, comercializando apenas drogas –mas as incluindo em sua carteira de negócios, quando conveniente. O modelo do tráfico armado, sustentado em domínio territorial, é atrasado, pesado, anti-econômico: custa muito caro manter um exército, recrutar neófitos, armá-los (nada disso é necessário às milícias, posto que seus membros são policiais), mantê-los unidos e disciplinados, enfrentando revezes de todo tipo e ataques por todos os lados, vendo-se forçados a dividir ganhos com a banda podre da polícia (que atua nas milícias) e, eventualmente, com os líderes e aliados da facção. É excessivamente custoso impor-se sobre um território e uma população, sobretudo na medida que os jovens mais vulneráveis ao recrutamento comecem a vislumbrar e encontrar alternativas. Não só o velho modelo é caro, como pode ser substituído com vantagens por outro muito mais rentável e menos arriscado, adotado nos países democráticos mais avançados: a venda por delivery ou em dinâmica varejista nômade, clandestina, discreta, desarmada e pacífica. Em outras palavras, é melhor, mais fácil e lucrativo praticar o negócio das drogas ilícitas como se fosse contrabando ou pirataria do que fazer a guerra. Convenhamos, também é muito menos danoso para a sociedade, por óbvio.

(c) O Exército deveria participar?

Fazendo o trabalho policial, não, pois não existe para isso, não é treinado para isso, nem está equipado para isso. Mas deve, sim, participar. A começar cumprindo sua função de controlar os fluxos das armas no país. Isso resolveria o maior dos problemas: as armas ilegais passando, tranquilamente, de mão em mão, com as benções, a mediação e o estímulo da banda podre das polícias.

E não só o Exército. Também a Marinha, formando uma Guarda Costeira com foco no controle de armas transportadas como cargas clandestinas ou despejadas na baía e nos portos. Assim como a Aeronáutica, identificando e destruindo pistas de pouso clandestinas, controlando o espaço aéreo e apoiando a PF na fiscalização das cargas nos aeroportos.

(d) A imagem internacional do Rio foi maculada?

Claro. Mais uma vez.

(e) Conseguiremos realizar com êxito a Copa e as Olimpíadas?

Sem dúvida. Somos ótimos em eventos. Nesses momentos, aparece dinheiro, surge o “espírito cooperativo”, ações racionais e planejadas impõem-se. Nosso calcanhar de Aquiles é a rotina. Copa e Olimpíadas serão um sucesso. O problema é o dia a dia.

Palavras Finais:

Traficantes se rebelam e a cidade vai à lona. Encena-se um drama sangrento, mas ultrapassado. O canto de cisne do tráfico era esperado. Haverá outros momentos análogos, no futuro, mas a tendência declinante é inarredável. E não porque existem as UPPs, mas porque correspondem a um modelo insustentável, economicamente, assim como social e politicamente. As UPPs, vale dizer mais uma vez, são um ótimo programa, que reedita com mais apoio político e fôlego administrativo o programa “Mutirões pela Paz”, que implantei com uma equipe em 1999, e que acabou soterrado pela política com “p” minúsculo, quando fui exonerado, em 2000, ainda que tenha sido ressuscitado, graças à liderança e à competência raras do ten.cel. Carballo Blanco, com o título GPAE, como reação à derrocada que se seguiu à minha saída do governo. A despeito de suas virtudes, valorizadas pela presença de Ricardo Henriques na secretaria estadual de assistência social --um dos melhores gestores do país--, elas não terão futuro se as polícias não forem profundamente transformadas. Afinal, para tornarem-se política pública terão de incluir duas qualidades indispensáveis: escala e sustentatibilidade, ou seja, terão de ser assumidas, na esfera da segurança, pela PM. Contudo, entregar as UPPs à condução da PM seria condená-las à liquidação, dada a degradação institucional já referida.

O tráfico que ora perde poder e capacidade de reprodução só se impôs, no Rio, no modelo territorializado e sedentário em que se estabeleceu, porque sempre contou com a sociedade da polícia, vale reiterar. Quando o tráfico de drogas no modelo territorializado atinge seu ponto histórico de inflexão e começa, gradualmente, a bater em retirada, seus sócios –as bandas podres das polícias-- prosseguem fortes, firmes, empreendedores, politicamente ambiciosos, economicamente vorazes, prontos a fixar as bandeiras milicianas de sua hegemonia.

Discutindo a crise, a mídia reproduz o mito da polaridade polícia versus tráfico, perdendo o foco, ignorando o decisivo: como, quem, em que termos e por que meios se fará a reforma radical das polícias, no Rio, para que estas deixem de ser incubadoras de milícias, máfias, tráfico de armas e drogas, crime violento, brutalidade, corrupção? Como se refundarão as instituições policiais para que os bons profissionais sejam, afinal, valorizados e qualificados? Como serão transformadas as polícias, para que deixem de ser reativas, ingovernáveis, ineficientes na prevenção e na investigação?

As polícias são instituições absolutamente fundamentais para o Estado democrático de direito. Cumpre-lhes garantir, na prática, os direitos e as liberdades estipulados na Constituição. Sobretudo, cumpre-lhes proteger a vida e a estabilidade das expectativas positivas relativamente à sociabilidade cooperativa e à vigência da legalidade e da justiça. A despeito de sua importância, essas instituições não foram alcançadas em profundidade pelo processo de transição democrática, nem se modernizaram, adaptando-se às exigências da complexa sociedade brasileira contemporânea. O modelo policial foi herdado da ditadura. Ele servia à defesa do Estado autoritário e era funcional ao contexto marcado pelo arbítrio. Não serve à defesa da cidadania. A estrutura organizacional de ambas as polícias impede a gestão racional e a integração, tornando o controle impraticável e a avaliação, seguida por um monitoramento corretivo, inviável. Ineptas para identificar erros, as polícias condenam-se a repeti-los. Elas são rígidas onde teriam de ser plásticas, flexíveis e descentralizadas; e são frouxas e anárquicas, onde deveriam ser rigorosas. Cada uma delas, a PM e a Polícia Civil, são duas instituições: oficiais e não-oficiais; delegados e não-delegados.

E nesse quadro, a PEC-300 é varrida do mapa no Congresso pelos governadores, que pagam aos policiais salários insuficientes, empurrando-os ao segundo emprego na segurança privada informal e ilegal.

Uma das fontes da degradação institucional das polícias é o que denomino "gato orçamentário", esse casamento perverso entre o Estado e a ilegalidade: para evitar o colapso do orçamento público na área de segurança, as autoridades toleram o bico dos policiais em segurança privada. Ao fazê-lo, deixam de fiscalizar dinâmicas benignas (em termos, pois sempre há graves problemas daí decorrentes), nas quais policiais honestos apenas buscam sobreviver dignamente, apesar da ilegalidade de seu segundo emprego, mas também dinâmicas malignas: aquelas em que policiais corruptos provocam a insegurança para vender segurança; unem-se como pistoleiros a soldo em grupos de extermínio; e, no limite, organizam-se como máfias ou milícias, dominando pelo terror populações e territórios. Ou se resolve esse gargalo (pagando o suficiente e fiscalizando a segurança privada /banindo a informal e ilegal; ou legalizando e disciplinando, e fiscalizando o bico), ou não faz sentido buscar aprimorar as polícias.

O Jornal Nacional, nesta quinta, 25 de novembro, definiu o caos no Rio de Janeiro, salpicado de cenas de guerra e morte, pânico e desespero, como um dia histórico de vitória: o dia em que as polícias ocuparam a Vila Cruzeiro. Ou eu sofri um súbito apagão mental e me tornei um idiota contumaz e incorrigível ou os editores do JN sentiram-se autorizados a tratar milhões de telespectadores como contumazes e incorrigíveis idiotas.

Ou se começa a falar sério e levar a sério a tragédia da insegurança pública no Brasil, ou será pelo menos mais digno furtar-se a fazer coro à farsa.

Postado por Luiz Eduardo Soares às 21:08

http://luizeduardosoares.blogspot.com/2010/11/crise-no-rio-e-o-pastiche-midiatico.html?spref=fb

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Vamos de braços dados.

O inimigo agora é outro. Essa foi a chamada muito usada para o filme do momento.

Milhares de pessoas estão acompanhando outras milhares sendo vítimas e sendo presas por um desequilíbrio de forças. Foram décadas de negligência dos governos, ausente em diversos setores básicos, fundamentais para o crescimento organizado das cidades. Crianças saem da maternidade, muitas vezes, com o peso da fome e do abandono; jovens aprendendo sem escola, sem família; adultos, sem limites. É nesse espectro que os muros da insegurança e do terror cercam as nossas casas. A mesma classe média que agora confia no poder público, na segurança pública diante o espetáculo midiático de vários "meus guris", guris que nascem pelos bailes funks e seguem a lógica excludente que esta classe determina. Olhares de nojo, vidros elétricos levantados, esmola humilde e exploração do trabalho servil ad eternum.

Se fosse por um acidente, já seria lastimável; agora, sendo produto desta desorganização complexa...





...sem palavras.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Lente de um ponto.

Ontem foi a realização do ENADE - Exame Nacional de Desempenho dos Estudante - quando milhares de jovens universitários do país responderam as perguntas. Se foram honestos não sei; mas essas respostas farão parte dos resultados obtidos por meio das vontades e das motivações de cada um.

Era um dia sol e calor na cidade do Rio de Janeiro, uma tarde convidativa para a contemplação ou mesmo para um merecido descanso. Foram quarenta questões, sendo quatro discursivas, de temas que variam desde conhecimentos específicos de cada área até os de formação geral; ou seja, de cunho político. Nada contra. É o que se espera de jovens formados durante toda graduação, com as mais diferentes vivências pessoas, que serão futuros ou futuras profissionais, tendo o compromisso de se posicionarem diante fatos e situações.

Gostei. Achei muito boas as questões, todas bastantes equilibradas, claras e objetivas em seus propósitos. Esperemos que esse retorno dos estudantes possam efetivamente servir de molde para as urgentes necessidades de melhoras tanto nas universidades quanto no ensino.

Agora, eis uma das minhas respostas discursivas acerca do seguinte tema:

Comportamento ético nas sociedades democráticas

Em seu texto, aborde os seguintes aspectos:

a) Conceito de sociedade democrática;
b)Evidências de um comportamento não ético de um indivíduo;
c) Exemplo de um comportamento ético de um futuro profissional comprometido com a cidadania.



Este? Aquele? Muito mais do que apontar qual o caminho, a democracia representa a chance de ouvir vozes, ecos ou pensamentos de todos os atores sociais. Não encerra assim o equilíbrio eqüitativo das várias vontades políticas. Cada vista em seu ponto guarda em si sua história ou suas motivações para atravessar o caminho da ética.

Usar dinheiro ou verba pública, por exemplo, em benefício próprio é não ético com as obrigações tanto de um cidadão quanto de um servidor público permanente ou temporário; mas é seguir seus impulsos morais para atender a ética a que pertence seus interesses. A questão é: a apropriação indevida de verba pública é mais do que anti-ética; é crime. A motivação a que levou o desvio de conduta, deixemos para a psicanálise; o desvio de conduta, para a lei.

Um futuro profissional comprometido com a cidadania, independente do comportamento ético, deverá cumprir e zelar a lei a que é submetido. Deverá, por princípio, garantir o respeito e a dignidade humana, de acordo com a moral vigente. A ética pode até transformar-se. A moral pode também relativizar-se; porém, o calor de um abraço, a luz de um sorriso e a certeza de um bem-estar garantem tão bem o anseio de nossa bandeira: ordem e progresso.

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Palavra amiga; palavra que cura.




De um conto intimista misturado a uma fantasia real, mais um "não" foi por terra. Aliás, o segundo criptografado em letras e enredos. Somos feitos de carne, osso e de muito proveito com dramas e emoções.

Ofereço este exemplar a todos que um dia ousaram acreditar em tantas negativas que hoje conhecem a dimensão exata de seus infinitos: na janela, o céu não há limite.

Ps: Quem leu, saberá.

Ps2: Aos interessados:

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Re-leitura da Re-visão

Acerca do marco inicial, do espanto de onde e como viemos, o zero tem o seu valor máximo. Ele é o nada, que resulta tudo. A ausência mais completa que um sentimento humano pode perceber. Do zero, uma pedra; do zero, mais zeros.

Para isso, para o zero e para todas as pedras, lanço uma homenagem à pedra angular de nossas vidas; à pedra sobre todas as pedras: à nossa mãe.

Do nada, do indefinido, do pingo que seja alguém, surge algo. Pedras no caminho? Mais caminho.

Pedra, caminho, pedra



O princípio não sei
complemento o ambíguo
quem, o quê, quando

Uma gota pode ser muito
tudo pode ser pouco
pedra, pingo, ponto

Um choro pode ser nada
rir pode ser muito
água, pingo, ponte

Um ato pode ser nunca
gestos podem ser sempre
fome, pingo, ponta

Um ai pode ser alguém
gritos podem ser ninguém
verdade, pingo, pinta

Mãe, mãe é para sempre toda
amor que não tem igual
amizade, pingo, ponte

Fato pode ser indefinido
sujeito pode ser indeterminado
um pingo pinta

quem?


Suspiro

Partimos ao infinito
juntos chegamos ao céu
seu sorriso terno e bonito
como a cera, a abelha e o mel

Versos sinceros tornam-se mínimos
na dilacerante paixão pela natureza
oferece o amor aos íntimos
completando o círculo da beleza

a sacra união dos corpos
é linda, é perfeita
até o último respirar

Pára o mundo, o mundo não quer parar
meu amor, mais um dia
na água, na terra e no ar.

12/03/2001

Um dia

No frio da melancolia
eu chorava
você ria

No frio da melancolia
p'ra mim era noite
p'ra você dia

No frio da melancolia
eu esperava
você fazia

No frio da melancolia
eu, espírito
você vivia.

Ps: em algum dia de 2001.

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Resgate

Morre o homem. Fica a maestria de um poeta, que cantava como escrevia; que chorava como sorria; que vivia como morria. Era denso e intenso seu sentimento primaz de cortesia. A voz rouca era mais do que uma marca fônica de masculinidade; antes fosse, eram as lágrimas rotas presas à faringe. De todos já lembrados pelo colunista, faltam os anônimos de bares e de cantos chorados. Um a um declamando versos ou canções a quem não merece. Acaso merecesse, não se teria o vazio melancólico das frustrações; do esquecimento. Era apenas uma sonho, a qual acabara em sofrimento tão real que ser apaixonado e sincero tornaram-se ícones dos bregas.

Ao Waldick, nosso respeito e muitas saudades!

Domingo, 14 de setembro de 2008.

Ps: Mensagem escrita como resposta a meu sogro, que me noticiou a morte do cantor.

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Re-significação

Ressignificação


Há um aperto, força constrictora de amargura

que ninguém sabe de onde vem

e nem como surge

uma força muda, sem igual intensidade

com choros, com sofrimentos

singulares



a tal força torce, retorce por dentro

rangendo dentes, sardonicamente,

impura de emoções menores, baixa

aos nossos desafetos.




Re-leitura

Transformação

Já fui um
e muito mais:
sozinho e com todos
já fui um.

Hoje, tento não ser
hoje, sou o que não era
hoje, os olhos brilham
apagados.

Saio por uma fresta
como quem escolhe
a outra
a que não poderia ser.

O ponto e a pedra
a pedra afunda
e o ponto
acaba.

A beleza está aí:
na simples natureza morta
no conceito mais primitivo
de ser feliz.

A pedra afunda
a chuva molha
o beijo amado
o riso infantil.

O ontem, um
hoje, nada
amanhã, não sei.



Ecos da história


Comunidade acadêmica, uní-rio!
15.3.2009

Palavras são apenas palavras. Nada que se escreve ou que se fala é capaz de mover um átomo sequer da vontade de ver um bem-comum melhor. Às vezes, parecem flores, mas são poesias; outras vezes, farpas; mas são puras grosserias. É chegada a hora para alguma coisa. Não sei o que é, porém há de ter a certeza de mudança.

Para começar, saber todas as negativas já é o começo. Não quero isso. Não quero aquilo. A vontade coletiva parte dos interesses pessoais e os interesses pessoais limitam-se pelo respeito aos ditames coletivos, garantindo o convívio ético das diferenças. Têm-se três, pelo menos, esferas de conflito: docente, discente e técnicos-administrativos. Cada uma delas possui suas prerrogativas, mas todas pertencem a um bem maior. Não interessa se é bom ou foi bom; e sim se para o convívio próximo houve mudanças, já lembradas noutro momento.

Depois, há também de não se esquecer que uma fase é composta por vários períodos, no dia à dia, de modo arrastadamente gradual. Se todos andassem com um diário, notas e mais notas seriam ao fim mais do que lembranças: seriam marcos de produtividade. Num momento em que se gasta tanto tempo e dinheiro para sensibilizar a todos da extrema concorrência, globalização, a produtividade torna-se o pilar mister do avanço institucional baseado no tripé - já clichê - ensino, pesquisa e extensão. A memória engana o povo. As lembranças são de quem as dominam por critérios de seleção.

E agora? Existem caminhos diversos e não sabemos do futuro. Ora, o mínimo é andar junto. Ter uma forte ressonância e convergência de interesses. Nesse caso, dá para vislumbrar também somente três: dos docentes, discentes e técnicos-administrativos. Escolher, com isso, se torna mais fácil de, na hora da assembleia, ideias serem confrontadas e, a partir daí, emergir uma síntese melhor possível. “Quem não discute, não tem direito de reclamar” é um dos ditados mais falados por meu avô.

A sabedoria vem de longe e não precisa estar numa universidade para tê-la. A roda já foi inventada e o que se faz é criar mais efeitos para a sua função. Está tudo pronto em nossa universidade, só faltam mais efeitos de luz, câmera e ação, porque brilho próprio ela possui. Cada membro desta honrosa Universidade ilumina mais do que seus corredores; mais do que suas salas; leva luz ao mundo em que se vive com suas geniais e peculiares contribuições. Somos a roda. E queremos um merecido designer de reconhecimento e não uma carcaça velha de museu que nos impuseram.

As idéias são as mesmas e a luta continua. Queremos melhores condições de trabalho. Queremos capacitação profissional. Queremos difundir conhecimento. Queremos uma só paixão. Somos Unirio. Somos um corpo com vários membros, que, sem um deles, sentimos uma imensa falta.

É a hora! Independente de qual for o resultado, deve-se levar para sempre a lição de fazer de uma fase (gestão administrativa), uma caminhada, onde as lembranças ficam no papel e a memória no presente de quem faz a História acontecer. Todo ponto-de-vista converge-se sob o mesmo raio para um centro. Plural, mas soberano. Diverso, mas único. Coerente, mas paradoxal como qualquer desfecho que nunca acaba.



Retro-perspectiva

Transitividade

Nasce o dia, bom dia!
pensamentos voam vazios
o ser entra nas narinas
a cada segundo de vivência

Pena, pedra, ponto
pelo, pinto, para,
pêra, pára, porta
pele, pata, pinta

pinta, pêlo, puto
porco, pisca, pomo
pica, pixe, porca
pulga, pilo, pólo

Nem tudo vem
como vão todos por aí
palavras saem sem saber
sem tino, sem razão.

A imagem fica
as pessoas mudam




Retro-visor

Vivendo na epiderme

À superficialidade, riso frouxo. Rimas e versos pretensiosamente ricos, com medidas precisas, obedecem a lógica do eco fácil, da rima pobre e do conteúdo vazio.

Sobre o tema, há muito que discutir. Nunca foi simples posicionar-se diante de fenômenos, de eventos excepcionais que causam tanto estranheza quanto dúvidas. Além da legitimidade, das implicações técnicas da medicina, do caráter penal primário do estupro, da ordem moral; tem ainda o senso comum, natural, de cada ser humano a respeito do acontecimento. O unanimidade, por isso, é impulsiva. No entanto, a justiça é contemplativa.

Se por um lado, na ordem de trânsito, os maiores protegem os menores; da mesma maneira, a ética cristã baseia-se: O estuprador é fácil identificar e, com isso, os crimes e as penas são rapidamente enquadrados e setenciadas. A sociedade facilmente compadece-se com a menina. E o menor de todos? O que ele merece? Quem o nota? De outro modo, não é porque me xingaram ou humilharam dentro de meu carro, que me dão o direito de matar quem o fez. Aí, têm-se três vértices bem definidos: O agressor, a vítima e o veículo. O primeiro com sua pena; o veículo com seus possíveis danos e a vítima? Nessa atmosfera, a avaliação de danos é mal definida; porém, os limites individuais são facilmente percebidos. A cada um, com o seu propósito.

Com tantos avanços na Medicina, Psicologia, Pedagogia, com tentativas frustras ou não de prolongar a vida no respirador, por que não tentar salvar dois seres humanos: uma vítima e um inocente? Onde há vida; há esperança.

Agora, aos risos:


Cordel dos excomungados
Miguezim de Princesa*

I

Peço à musa do improviso
Que me dê inspiração,
Ciência e sabedoria,
Inteligência e razão,
Peço que Deus que me proteja
Para falar de uma igreja
Que comete aberração.

II

Pelas fogueiras que arderam
No tempo da Inquisição,
Pelas mulheres queimadas
Sem apelo ou compaixão,
Pensava que o Vaticano
Tinha mudado de plano,
Abolido a excomunhão.

III

Mas o bispo Dom José,
Um homem conservador,
Tratou com impiedade
A vítima de um estuprador,
Massacrada e abusada,
Sofrida e violentada,
Sem futuro e sem amor.

IV

Depois que houve o estupro,
A menina engravidou.
Ela só tem nove anos,
A Justiça autorizou
Que a criança abortasse
Antes que a vida brotasse
Um fruto do desamor.

V

O aborto, já previsto
Na nossa legislação,
Teve o apoio declarado
Do ministro Temporão,
Que é médico bom e zeloso,
E mostrou ser corajoso
Ao enfrentar a questão.

VI

Além de excomungar
O ministro Temporão,
Dom José excomungou
Da menina, sem razão,
A mãe, a vó e a tia
E se brincar puniria
Até a quarta geração.

VII

É esquisito que a igreja,
Que tanto prega o perdão,
Resolva excomungar médicos
Que cumpriram sua missão
E num beco sem saída
Livraram uma pobre vida
Do fel da desilusão.

VIII

Mas o mundo está virado
E cheio de desatinos:
Missa virou presepada,
Tem dança até do pepino,
Padre que usa bermuda,
Deixando mulher buchuda
E bolindo com os meninos.

IX

Milhões morrendo de Aids:
É grande a devastação,
Mas a igreja acha bom
Furunfar sem proteção
E o padre prega na missa
Que camisinha na lingüiça
É uma coisa do Cão.

X

E esta quem me contou
Foi Lima do Camarão:
Dom José excomungou
A equipe de plantão,
A família da menina
E o ministro Temporão,
Mas para o estuprador,
Que por certo perdoou,
O arcebispo reservou
A vaga de sacristão.

(*) Poeta popular, Miguezim de Princesa é paraibano e está radicado em Brasília.

http://recantodasletras.uol.com.br/cordel/1480133



Re-visão

Coração de Pedra

Acerca do marco inicial, do espanto de onde e como viemos, o zero tem o seu valor máximo. Ele é o nada, que resulta tudo. A ausência mais completa que um sentimento humano pode perceber. Do zero, uma pedra; do zero, mais zeros.

Para isso, para o zero e para todas as pedras, lanço uma homenagem à pedra angular de nossas vidas; à pedra sobre todas as pedras: à nossa mãe.

Do nada, do indefinido, do pingo que seja alguém, surge algo. Pedras no caminho? Mais caminho.

Pedra, caminho, pedra



O princípio não sei
complemento o ambíguo
quem, o quê, quando

Uma gota pode ser muito
tudo pode ser pouco
pedra, pingo, ponto

Um choro pode ser nada
rir pode ser muito
água, pingo, ponte

Uma palavra pode ser nunca
gestos podem ser sempre
fome, pingo, ponta

Um pai pode ser alguém
filhos podem ser ninguém
verdade, pingo, pinta

Mãe, mãe é para sempre toda
amor que não tem igual
amizade, pingo, ponte

Algo pode ser indefinido
sujeito pode ser indeterminado
um pingo pinta

quem?




sábado, 7 de agosto de 2010

Rivo, ouvi-nos!

Há um grito
um susto
galopante

quero dizer
e nada
falo

a todo momento
um desafio de ser
alguém

Vento vai
vento vem
e o que
fica?


quinta-feira, 15 de julho de 2010

Nada a dizer.

Deu empate. Bandeirinhas, bandeirolas, tinha choro com vela. No final, alguém vai regar a felicidade de outrem. Futebol é a arte de anjos com pernas tortas; majestade sem fidalguia; exemplo sem valor e dunga zangado. Poder-se-ia discorrer centenas de linhas a respeito do esporte mais popular do mundo; aliás, o mais lucrativo também. E aí está o problema. Quando se era apenas um passatempo lúdico com ousadia amadora, não tinha arte; não tinha público. Depois, que veio o espírito esportivo, a mágica olímpica, começava a expressar-se a beleza competitiva, o show da plateia e o espetáculo midiático - "O homem é o lobo do homem".

E blá-blá-blá...

terça-feira, 29 de junho de 2010

Mais um ponto.


"O homem nasceu para aprender, aprender tanto quanto a vida lhe
permita".

Guimarães Rosa

Ponto. Entre a questão de ensinar ou de aprender, na vida, a melhor opção é viver. Parece ser redundância o último período grafado, mas representa o quão é inócuo posicionar-se diante das quase normas de condutas. O dinamismo dos fatos e das circunstâncias fazem com que os dois quesitos sejam pilares em constantes transformações de pensamentos e de abordagens do processo de transmissão de conhecimento. Irão existir inúmeros defensores a dizerem que no ensinar há um dom artístico, quase mágico; enquanto, um não-menor número firmará posição na suma competência sócio-biológica de poder aprender sob a égide do determinismo natural. Cada ponto-de-vista especializa-se em se justificar, de preferência, em contraposição ao que se deseja combater; e, a partir daí, polarizam-se. Bem, de versões a versões, vão construindo-se verdades e mais verdades sobre o cimento dos fatos. E a arte? Essa está na maneira livre e espontânea de se associar a um dos pólos. Do nada, pode-se fazer o mundo – isso é arte.

Até o não-fazer poderá ser relevante no pleno processo de ensinar. Aquela dúvida que ocorrera na matemática de há algum tempo e o silêncio atroz da falta de conhecimento por parte dos mais experientes permitiram às mentes vazias produzirem formidáveis idéias: para o bem ou para o mal do exercício diário da disciplina. No entanto, há aqueles que se dedicam a construção ativa do sujeito ávido pelo conteúdo a ser ensinado. Diversas teorias baseadas em bastantes modelos eficazes e em outros nem tanto, aliam-se ou confrontam-se com a fina finalidade de transmitir as informações referenciais. Modelo de sala de aula em ambiente fechado, com normas e uniformes, giz e professores perante a assembléia disposta a sua frente, mostra-se vigente e ainda é eficaz nos dias de hoje. Pouco importa se um gosta ou não entende, a preocupação está na média: determina-se o quanto deverá saber de tudo que fora exposto. A apótema do dodecágono inscrito num certo círculo é tão fundamental quanto os conceitos e as práticas de uma função de primeiro grau. E a arte? Está na abstração da utilidade; na recompensa do final de ano, quando se é aprovado para cursar o próximo ciclo de aprendizado. A arte é a forma de como se entende; se vê e se adquire. Por outro lado, há os que acreditam na aquisição natural do aprendizado, respeitando assim, o tempo particular de cada desenvolvimento cognitivo. Para esses, o indivíduo é uma peça acabada. Será uma questão de horas para o sujeito perceber o seu mundo. Ensinar passa pelas mais energéticas atividades humanas: como dizer a um russo que um bom samba é dois pra lá, dois pra cá? Por mímica? Não sei. A vida imita a arte, mas o oposto...

É assim, dois pra cá, e as pernas soviéticas não acompanham com a mesma naturalidade. É a harmonia, o rítmo, o compasso e o enredo. São muitas variáveis e limitantes, para que a adequada forma de se tentar ensinar torne-se realmente eficiente. A maneira com que o russo apreenderá a mímica está intimamente associado à sua acumulação cultural: sua genética e seu ambiente social. Enfim, depende de sua arte de agir diante dos fatos e dos acontecimentos. Imaginar-te – É rima, é parte, é arte, é cada ponto-de-vista.

Na outra ponta do mister vínculo humano, há os tijolos do grande muro da ciência – a capacidade inata de aprender. Por diversas vias, vêm as informações: pelos olhos, pelos ouvidos, pelas mãos e até pelas narinas e pela boca. Aprender é sentir. E a arte? É o sentimento livre. Não se pode aprender sem sentir emoções; elas permitem o mergulho profundo nas águas do saber. A ciência já demonstrou por alguns ensaios de neurociência que pelo impacto das ações, pelo sentimento, a memória tão necessária para o aprendizado cristaliza-se na mente. É fácil testar tal assertiva, se imaginar, que, além dos cinco sentidos, a capacidade de associação dos fatos ou dos eventos permite resgatar aquilo uma vez já apreendido; seja pela leitura, pela escrita ou pela vivência. Se viver é sentir e aprender é sentir; nem ouse concluir o silogismo. Pronto. Aprender é isso. Uma lembrança; um conhecimento. Os detalhes, só quando interessam.

A uma flor, água, luz e terra. A uma criança, estímulo, atenção e carinho. Pode-se, dessa forma, parecer uma rasa simplificação; no entanto, é o método mais eficaz para levar ao ser em formação as ferramentas fundamentais para o seu construtivismo intelectual. Terão alguns com fortes discordâncias a respeito do método citado. Constrói pra cá, socializa-se pra lá, impõe-se de um jeito ou deixa acontecer, pois tudo que se precisa já vem pronto. Não importa. Nunca se deve esquecer, portanto, da finalidade: transmissão de forma mais agradável a informação. Se é útil, só o tempo e a oportunidade dirão. Cada ser é um universo singular, o qual caberão a ele necessidades especiais, com a atenção que merece. Enquanto o estímulo, vem da dinâmica instável do afluxo de conteúdos referenciais ou informais, capazes de prover sempre o crescimento pessoal; já o carinho, é a ponta mais complexa do processo. Com toda relevância dos sentidos, da lembrança, das emoções dos acontecimentos ou do impacto dos fatos, a maneira de se abordar, mostrando-se próximo e atento às dificuldades particulares, com todo carinho à disposição, é fundamental. Inicia-se lá pelos primórdios da comunicação, em que os pais, ou quem se dedica à criança, preocupam-se com o olhar, com o toque, com, de novo, a atenção; visto que são esses primorosos momentos que cada indivíduo sentir-se-á protegido, seguro de si e apto para aprender e logo ensinar; é como se fosse um repositório de segurança sendo completado, e, quando mais cheio, mais se consegue transmitir; quando se menos, por pouco tempo. Segurança permite ter força. Fornece poder. E dela se emana a faculdade do aprendizado ativo, aquele que, por interesse próprio, liberta os seres umbrais da terrível sombra da ignorância. Sem vontade, sem luz.

Até um computador pode ensinar, devido a sua alta capacidade de armazenagem de informações, fazendo a interface humana aprender; pois, pela arte dos sentidos, é que o lúcido entendimento é possível. Do contrário, é a ausência de substanciais indefinições da natureza humana, tais como: sentir, ter vontade, consciência; que faz do computador uma criatura estática, limitada com seu raciocínio binário. O que adianta garantir o pleno acesso às notícias e às informações, seja através da memória, seja da conexão entre computadores; se o que permite o rico espírito dinâmico e ávido pelo desenvolvimento pessoal é a ímpar função de sermos eternos na arte: tudo tem a sua duração; tudo se acaba; menos a vista de cada ponto, menos o ponto de cada vista, menos o ponto-de-vista de toda obra de arte. A arte expressa-se.

Pode-se, com isso, perceber que a arte permeia ambos os pilares. É a forma autônoma de estar vivo, além de possuir todas as funcionalidades vitais. Respirar todos os viventes o fazem; mas viver intensamente, com sangue e com a consciência das emoções correndo lado a lado nos vasos, é algo unicamente humano. Toda e qualquer explicação acerca da arte de ensinar será insuficiente para se deixar inteligível a arte de aprender. São mais do que dois em um; mais do que mão e a luva; mais do que importantes ou prioriários; são artes. São expressões de cada vivência passada por um único ponto; mais um ponto de vista na circunferência dos fatos e dos acontecimentos.

terça-feira, 22 de junho de 2010

Encontros e compassos.

Querido,

realmente a poesia, a canção com a dose e a medida certa de melodia, com emoção, brota como cada respiração. Eu, ainda não tenho a experiência da paternidade, mas Deus me proporcionou a graça de ser tio de três lindas, imprescindíveis, sobrinhas. A cada uma, um soneto. É a forma que dedico a expressar o que sinto de maneira mais universal. Os olhares, o afago, o toque de pele e de cor, o frio e o suor singulares ficam para a nossa aliança genealógica.

Não preciso registrar para curtir todo o segundo, momento ímpar de vocês. Pelo texto, pela música, pelo tom fluido das palavras e rimas já testemunha esse sopro, "essa ventania" necessária para viver.



domingo, 23 de maio de 2010

Onde há luz, há sombra.

Now ain't that special? The implications of creating the first synthetic bacteria

By Arthur L. Caplan

Is life special, so special that we cannot understand it, much less create it? Are living things endowed with some sort of special power, force or property that distinguishes the inorganic from the organic, the living from the dead? Can life be nothing more than the precise interaction of physical stuff?

Scientists, theologians and philosophers have been wrangling over this issue for eons. For many, the wondrous nature of what permits something to be alive has been a mystery that science never, ever could penetrate. Life is sacred, special, ineffable and beyond human understanding. Except it isn’t.

What seemed to be an intractable puzzle, with significant religious overtones, has been solved. J Craig Venter, Ham Smith, Clyde Hutchinson, Daniel Gibson and a team of scientists at the Venter Institute in Rockville, Md., have made a new living bacterium from a set of genes they decoded, artificially combined and then stuck into the cored out remains of the bacterium of another species. In other words, they created a living thing from man-made parts. Or, in more important words, they created a novel lifeform from man-made parts.

Why did they do it? Well, in part to resolve the age-old debate that life is not reducible to the sum of any parts. But, they also know that the techniques of gene synthesis involved in this remarkable achievement hold out much promise for humankind.

Synthetic biology should permit scientists to make microbes that solve many of our most pressing problems. Building bacteria that digest oil and chemical pollution from leaks and spills or eat cholesterol and other dangerous substances that accumulate in our bodies is all to the good.

Still, this hugely powerful technology does need oversight. Bad guys making nasty bugs or those who are not very careful about where they release new living viruses or bacteria could pose serious risks to our health and environment. Venter and his group were careful to use tiny molecular changes to "watermark," or stamp their creation—an identification requirement that any scientist or company ought be required to utilize when using the techniques of synthetic biology.

It will take both national and international efforts, but these problems can be addressed. The deeper question: is the dignity of life imperiled by showing that human beings can create a novel living thing? I think not. There are those who are enthralled by the idea that life is a riddle beyond solution. However, the value of life is not imperiled or cheapened by coming to understand how it works.


ABOUT THE AUTHOR
Arthur Caplan is Sidney D Caplan Professor and the Emmanuel and Robert Hart Director of the Center for Bioethics at the University of Pennsylvania. Before joining Penn in 1994, he taught at the University of Minnesota, the University of Pittsburgh and Columbia University. He is author or editor of 29 books, including The Penn Guide to Bioethics (Springer, 2009).

http://www.scientificamerican.com/blog/post.cfm?id=now-aint-that-special-the-implicati-2010-05-20

domingo, 16 de maio de 2010

Lição

À noite, em meio à brisa, pensamentos dispersam numa atmosfera rica, repleta de desejos e de angústia. Aliás, mais dúvida do que qualquer coisa.

O que fazer?


Apenas escolher a opção errada, já que a certa é a que estará na virtualidade rasa dos instintos materiais.

segunda-feira, 1 de março de 2010

Quereria eu também

A Última Crônica


Fernando Sabino




A caminho de casa, entro num botequim da Gávea para tomar um café
junto ao balcão. Na realidade estou adiando o momento de escrever.


A perspectiva me assusta. Gostaria de estar inspirado, de coroar com êxito mais um ano nesta busca do pitoresco ou
do irrisório no cotidiano de cada um. Eu pretendia apenas recolher da vida diária algo de seu disperso conteúdo humano, fruto da convivência,
que a faz mais digna de ser vivida. Visava ao circunstancial, ao
episódico. Nesta perseguição do acidental, quer num flagrante de
esquina, quer nas palavras de uma criança ou num acidente doméstico,
torno-me simples espectador e perco a noção do essencial.
Sem mais nada para contar, curvo a cabeça e tomo meu café, enquanto o
verso do poeta se repete na lembrança: "assim eu quereria o meu último
poema". Não sou poeta e estou sem assunto. Lanço então um último olhar
fora de mim, onde vivem os assuntos que merecem uma crônica.


Ao fundo do botequim um casal de pretos acaba de
sentar-se, numa das últimas mesas de mármore ao longo da parede de espelhos. A compostura da humildade, na contenção de gestos e palavras, deixa-se acrescentar pela presença de uma negrinha
de seus três anos, laço na cabeça, toda arrumadinha no vestido pobre, que se instalou também à mesa: mal ousa balançar as perninhas
curtas ou correr os olhos grandes de curiosidade ao redor. Três seres
esquivos que compõem em torno à mesa a instituição tradicional da
família, célula da sociedade. Vejo, porém, que se preparam
para algo mais que matar a fome.

Passo a observá-los. O pai, depois de contar o dinheiro
que discretamente retirou do bolso, aborda o garçom,
inclinando-se para trás na cadeira, e aponta no balcão um
pedaço de bolo sob a redoma. A mãe limita-se a ficar olhando
imóvel, vagamente ansiosa, como se aguardasse a aprovação do garçom. Este ouve, concentrado, o pedido do homem e depois se afasta
para atendê-lo. A mulher suspira, olhando para os lados, a
reassegurar-se da naturalidade de sua presença ali. A meu
lado o garçom encaminha a ordem do freguês. O homem atrás do balcão
apanha a porção do bolo com a mão, larga-o no pratinho -- um bolo
simples, amarelo-escuro, apenas uma pequena fatia
triangular.

A negrinha, contida na sua expectativa, olha a garrafa de Coca-Cola e o pratinho que o garçom deixou à sua frente.
Por que não começa a comer? Vejo que os três, pai, mãe e
filha, obedecem em torno à mesa um discreto ritual. A mãe remexe na bolsa de plástico preto e brilhante, retira qualquer coisa. O
pai se mune de uma caixa de fósforos, e espera. A filha aguarda também, atenta como um animalzinho. Ninguém mais os
observa além de mim.

São três velinhas brancas, minúsculas, que a mãe espeta
caprichosamente na fatia do bolo. E enquanto ela serve a Coca-Cola,
o pai risca o fósforo e acende as velas. Como a um gesto
ensaiado, a menininha repousa o queixo no mármore e sopra
com força, apagando as chamas. Imediatamente põe-se a bater palmas, muito compenetrada, cantando num balbucio, a que os pais se juntam, discretos: "parabéns pra você, parabéns pra você..." Depois a mãe recolhe as velas, torna a guardá-las na bolsa.
A negrinha agarra finalmente o bolo com as duas mãos sôfregas
e põe-se a comê-lo. A mulher está olhando para ela com ternura --
ajeita-lhe a fitinha no cabelo crespo, limpa o farelo de
bolo que lhe cai ao colo. O pai corre os olhos pelo botequim,
satisfeito, como a se convencer intimamente do sucesso da
celebração. Dá comigo de súbito, a observá-lo, nossos olhos se
encontram, ele se perturba, constrangido -- vacila, ameaça
abaixar a cabeça, mas acaba sustentando o olhar e enfim se
abre num sorriso.

Assim eu quereria minha última crônica: que fosse pura
como esse sorriso.


Texto extraído do livro "A Companheira de Viagem", Editora
do Autor - Rio de Janeiro, 1965, pág. 174.

domingo, 28 de fevereiro de 2010

De onde ele vem?

O morcego

Meia-noite. Ao meu quarto me recolho.
Meu Deus! E este morcego! E, agora, vede:
Na bruta ardência orgânica da sede,
Morde-me a goela ígneo e escaldante molho.

"Vou mandar levantar outra parede..."
- Digo. Ergo-me a tremer. Fecho o ferrolho
E olho o teto. E vejo-o ainda, igual a um olho,
Circularmente sobre minha rede!

Pego de um pau. Esforços faço. Chego
A tocá-lo. Minh’alma se concentra.
Que ventre produziu tão feio parto?!

A Consciência Humana é este morcego!
Por mais que a gente faça, à noite, ele entra
Imperceptivelmente em nosso quarto!

Augusto dos Anjos





Um dia, eu tive um sonho:
que os membros faziam parte do corpo

Assim como o sonho,
o corpo não era gente.

Não sei como? Nem quando?
Esse mosaico genealógico.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Como já dizia a vovó.

"Como dizia minha avó: todo mundo se queixa da falta de memória. Ninguém se queixa da falta de caráter."

http://twitter.com/millorfernandes

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Piadas de última hora

"Qdo um carnavalesco tira 8,5 ou 9 xinga, se irrita. Pô! Devia ficar feliz! Pra quem nunca frequentou ensino médio essa é uma ótima nota!"

"Se ofenderam qdo Robin Willians disse q aqui só tem puta e cocaína. Mas se um gringo sintonizou TV brasileira esses dias pensou o q?"

"Noticías de Carnaval: Tráfego de veículos lento nas rodovias. Tráfico de drogas rápido nas cidades."

"Tá tão calor que acabei de ver uma mulher de chapinha rezando pra chover."

http://twitter.com/DaniloGentili

Na vida real, a chuva não cai; sobe.

Sem palavras.


Qui, 18 Fev, 04h30

A Justiça do Rio libertou um dos jovens envolvidos no assassinato do menino João Hélio Fernandes Vieites, de 6 anos, que morreu após ser arrastado por 7 km na zona norte do Rio, em 2007. A decisão do juiz Marcius da Costa Ferreira, da 2ª Vara da Infância e Juventude do Rio, datada do último dia 8, insere o jovem no regime semiaberto, no qual o preso trabalha de dia e passa a noite no instituto.

O jovem era menor na época e foi internado em um instituto para jovens infratores, na Ilha do Governador (RJ). Os outros envolvidos foram condenados em 2008.

De acordo com o juiz, "o adolescente está cumprindo medida desde 22 de março de 2007, sendo necessário mais tempo para que se convença das vantagens da mudança de vida, do voluntário afastamento de seu pernicioso habitat e grupo a que está integrado".

Em sua argumentação, o juiz afirma que será preciso estimular o jovem a participar de outras atividades e grupos socialmente saudáveis, como indicado nos últimos relatórios. O magistrado recomenda também acompanhamento psicológico ao ex-interno.


sábado, 30 de janeiro de 2010

Vozes do interior

Nessa tarde de verão, ventilador ligado e caixas no chão, o coração está ainda mais simpático. Daqui a pouco vamos ao supermercado, a um passeio cultural - aprendendo a rotina familiar. Faltando, por volta de dezoito meses para a concretrude de um sonho, o casamento vem à sombra. Ora desejo que venha, ora que chegue o mais rápido. O dia, as horas, os minutos nunca se entendem. O tempo é mais do que relativo; é conveniente. As dúvidas cercam a mente e se multiplicam ainda mais. A língua tem vida própria e a vontade, o seu destino livre.

Um dia, sonhei em passar para o vestibular de Medicina; o sonho acabou e eu continuo a dormir.

Hoje, a vontade é arrumar o baú.

E sempre ser feliz - paz, carinho, alegrias e muita saúde - com a minha mulher amada, querida, inspirada e partícipe de todas as minhas ações.